À frente do Mover, ela promove lideranças negras e equidade racial

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Mover, Natália Paiva, liderança negra

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Natália Paiva, diretora-executiva do Mover: “Essa é uma agenda que não é feita com o coração, e sim com recursos, estratégias, planejamento e metas, como qualquer outra área de negócio.”

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Há pouco mais de um ano, Natália Paiva assumiu como diretora-executiva do Mover (Movimento pela Equidade Racial), que trabalha ao lado de mais de 50 grandes empresas como L’Oréal, Diageo e PepsiCo com o objetivo de levar pessoas negras a cargos de liderança no Brasil. “Queremos resultados concretos para impactar positivamente a vida das pessoas negras e a sua ascensão profissional”, diz a executiva, que já trabalhou em gigantes como Meta e a consultoria McKinsey.

Mais especificamente, a meta é chegar a 10 mil líderes negros até 2030. Apenas este ano, foram mais de 2 mil profissionais promovidos a posições de liderança. “Nosso impacto agora é tangível. Temos muito a fazer, mas esse é um sinal claro de que estamos no caminho certo.”

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O cenário é desafiador. No Brasil, apenas 8% dos autodeclarados pretos e pardos ocupam cargos de liderança no ambiente em que trabalham, segundo uma pesquisa deste ano realizada com dois mil profissionais pela consultoria Indique uma Preta e a Cloo, empresa de investigação e consultoria comportamental. “Todo mundo conhece o funil: quanto mais você sobe, menor é a quantidade de pessoas negras.”

Fundado em 2021, o Mover tem como objetivo promover a equidade racial no setor privado por meio de uma coalizão empresarial, que hoje conta com 56 companhias. “Só neste ano, foram 170 mil profissionais contratados em apenas 31 das empresas associadas. Impactamos quase 100 mil pessoas negras com os nossos programas.”

O movimento oferece desde programas de capacitação, como bolsas para cursos de inglês e tecnologia, até formações para líderes, que envolvem o uso de ferramentas práticas e a criação de redes de conexão. “Essas pessoas estão em um momento de virada e são detectadas pelas próprias companhias como potenciais lideranças.”

Para participar do Mover, a empresa deve fazer um comunicado público sobre o compromisso de formar lideranças negras nos próximos anos, além de financiar o fundo do projeto. “Essa é uma agenda que não é feita com o coração, e sim com recursos, estratégias, planejamento e metas, como qualquer outra área de negócio.”

 

Temos que ficar bastante orgulhosos com o que temos feito, sem perder de vista onde queremos chegar.
Natália Paiva

A seguir, Natália Paiva analisa o cenário rumo à equidade racial no mercado de trabalho e os desafios para alcançar as metas do Mover.

Forbes: Você trabalhou em grandes empresas, como Meta e McKinsey. Como chegou ao Mover?

Natália Paiva: Até o fim de 2022, eu liderava a área de políticas públicas do Instagram para a América Latina na Meta, então cuidava de todos os temas regulatórios e reputacionais da plataforma no México e Argentina, mas era baseada em São Paulo. Saí de lá para criar a minha própria consultoria com foco em políticas públicas e tecnologia. Em seguida, veio o convite para o Mover. Hoje, tenho esse duplo chapéu. Minha consultoria atende big techs, mas meu trabalho no Mover como diretora-executiva é focado 100% no tema da diversidade.

Como o movimento atua? Quais as iniciativas?

O Mover é uma coalizão empresarial que conta hoje com 56 empresas. O foco é promover equidade racial no setor privado. A gente apoia as empresas de duas principais formas: uma é com ferramentas, boas práticas e conexões, para que as jornadas individuais de cada uma delas seja impulsionada. A outra é fomentar a carreira de pessoas negras. Neste ano, impactamos quase 100 mil pessoas por meio de programas de formação e capacitação, como bolsas de inglês, cursos livres, pós-graduação, programas focados em tecnologia e soft skills, etc.

Como um profissional que quer chegar a um cargo de liderança pode aproveitar os programas do Mover?

Uma das nossas vertentes é criar e oferecer programas de formação de lideranças para pessoas negras que estejam naquele momento de virada e que sejam potenciais lideranças já detectadas pelas próprias empresas. Neste ano, 908 pessoas passaram por programas de formação.

Eles são divididos em quatro formações de liderança. Um é uma parceria com o Instituto Four, que se chama Pro Líder Mover. É um programa presencial com professores de negócios da FGV e da Fundação Dom Cabral, com conteúdo voltado para as turmas formadas pelo Mover. O segundo é um programa de mentoria em parceria com a Top To You, que se chama Mover Conecta. Nele, a gente conecta esses colaboradores de alto potencial com pessoas que já têm uma trajetória mais sólida para que haja essa troca e impulsionamento. O terceiro é a Escola de Liderança Mover, que a gente criou este ano e colocou em prática com a Companhia de Talentos. O quarto é um programa com a McKinsey, o McKinsey Accelerator. Nele, os colaboradores são expostos a uma série de ferramentas essenciais para posições de liderança e também são conectados com pessoas de outras empresas ao redor do mundo.

Só neste ano, foram mais de 2 mil líderes negros chegando a cargos de liderança. Como você avalia esse avanço?

O Mover está completando três anos e nosso impacto agora é tangível. Temos muito a fazer, mas isso é um sinal claro de que estamos no caminho certo. Das 56 empresas, 31 responderam à catalogação de contratação, desligamentos e promoções. Em todas elas, os resultados foram positivos. A gente vê consistência e um movimento de mudança positiva.

Como você enxerga o atual cenário rumo à equidade racial na liderança das empresas no Brasil e no mundo?

É um cenário desafiador. Quando pensamos em liderança no Brasil, todo mundo conhece a discrepância entre a população em geral e a representação no mundo corporativo. Todo mundo conhece o funil: quanto mais você sobe, de supervisor para gerência, diretoria, presidência e até conselhos de administração, vai rareando a quantidade de pessoas negras. Estamos em uma posição melhor do que alguns anos atrás, porém a mudança é mais lenta do que a gente gostaria.

Como sociedade, o que a gente tem feito nos últimos anos no Brasil tem muito a ensinar ao mundo. Por meio de políticas públicas bem-sucedidas e de uma conscientização e ampliação de ações do setor privado, impulsionamos essa agenda que não se retrocede. É algo que me faz ser muito otimista em relação ao que vem. Eu vejo o Brasil cada vez mais se consolidando como uma referência em relação à criação e execução de estratégias de diversidade. Temos que ficar bastante orgulhosos com o que temos feito, sem perder de vista onde queremos chegar.

Quais têm sido os principais desafios e avanços nessa jornada?

A gente ainda tem muito a avançar em como as organizações lidam com dados relacionados à diversidade. O mapeamento de talentos também é um desafio. As organizações precisam ser mais assertivas, eficientes e perenes. Outro desafio muito importante é descolar o Brasil de contextos específicos de outros países. A gente precisa entender o que essa agenda significa para um país como o nosso, com seu histórico e seu contexto social, econômico, político e jurídico, além de compreender o que é necessário avançar do ponto de vista organizacional de cultura e gestão de pessoas para operar de maneira bem-sucedida nesse mercado.

A meta do Mover é promover equidade racial e levar 10 mil pessoas negras a posições de liderança até 2030. O que você espera do caminho até lá?

Vemos vários sinais de que essa agenda tem sido mais estruturada nas organizações. Mesmo quando há demissões, proporcionalmente, são menos pessoas negras demitidas. Nas promoções a cargos de liderança este ano, mais de 50% das pessoas promovidas nas organizações que fazem parte do Mover foram pessoas negras. Quero que a gente chegue às 10 mil posições em 2030, mas, mais do que o número em si, são os sinais de que não é o número pelo número, mas sim um caminho duradouro e perene que a gente está trilhando.

Além dos números, quais resultados mais te orgulham nessa trajetória?

O que me deixa mais feliz, satisfeita e com a sensação e certeza de que a gente está fazendo o certo é quando eu escuto o feedback das pessoas que têm passado pelos programas e o impacto na vida delas, tanto na carreira – que é o nosso objetivo primário – mas também do ponto de vista pessoal. O programa impacta a autoconfiança, como a pessoa se enxerga, a família e a comunidade na qual ela está.

Tem alguma história específica com os participantes que te marcou?

Em um dos vídeos de avaliação do programa, uma das participantes falou que tinha a sensação de trabalhar, trabalhar e trabalhar, mas não esperava que aquela promoção viria. Até mesmo esse direito da expectativa e do sonho é limitado. Outro depoimento que me marcou é de uma beneficiária de um dos programas. Ela tem 50 anos e falou que nunca tinha percebido antes que podia ser uma liderança. E agora via o tanto que tinha para oferecer para qualquer organização: a capacidade de resolver problemas, de comunicar e de liderar pessoas. Essa percepção de que a liderança tem outras caras para além do que a gente está acostumado a ver no dia a dia é fundamental.

Algum número te chama mais a atenção?

Em 2024, o nosso principal número são as 2000 lideranças. Outro número bastante forte é quase 100 mil pessoas impactadas pelos nossos programas, como bolsas de inglês, cursos livres e programas de formação de liderança. Por fim, a quantidade de pessoas negras que foram contratadas pelas associadas neste último ano: foram cerca de 170 mil. Esse número é bastante limitado, porque são 31 empresas, nem todas responderam. Então, ele é potencialmente mais alto.

Vocês têm parcerias com grandes empresas. Como foi o processo de conseguir esses nomes para se juntarem ao movimento pela equidade racial?

O Mover tem uma barreira de entrada relativamente alta. Para entrar, a empresa tem que comunicar publicamente esse compromisso de formar lideranças negras nos próximos anos. Ela também precisa fazer um financiamento, porque tudo isso custa dinheiro. É um tema que eu sempre faço questão de ressaltar. Essa é uma agenda que não é feita com o coração, ela é feita com recursos, estratégias, planejamento e metas, como qualquer outra área de negócio. Ao entrar no Mover, a empresa se compromete a financiar nosso fundo. Nós temos 56 grandes empresas. Elas nos buscam e nós construímos essas pontes.

Este ano, foram 10 empresas que entraram no movimento. Enquanto todo mundo está falando que a agenda está diminuindo, eu não só discordo, mas acredito que a expansão do Mover mostra que não é dessa maneira.

Com as mudanças no ambiente de trabalho desde a pandemia e a ascensão da IA, como você acredita que o cenário deve mudar nos próximos anos?

Ninguém sabe como vão ser os próximos 10 anos no mundo do trabalho. A gente navega em muitas incertezas. O que caminha mais para o lado de uma certa certeza é o fato de que a gente vai continuar precisando se relacionar e ter espaços, seja no mundo corporativo ou fora dele. Os temas de saúde mental e de diversidade, por exemplo, estão conectados em relação a ter ambientes mais justos e mais humanos para todo mundo. Nisso, eu acho que a gente não vai retroceder, porque é um avanço civilizatório que alcançamos como sociedade. As pessoas não são descartáveis, todo mundo tem direito ao espaço na mesa e todo mundo tem uma dimensão humana para além do que ela gera no trabalho. Do ponto de vista de negócios, a empresa será mais bem-sucedida se souber utilizar o que aquela pessoa tem de melhor e, obviamente, ela vai ser melhor em um lugar justo, equânime e que tem espaço para ela sentir que pertence e com os elementos para crescer de maneira saudável.

Olhando para o futuro, qual legado você gostaria de deixar como diretora-executiva do Mover?

Espero que essa agenda se fortaleça cada vez mais do ponto de vista concreto e com foco em resultados. Quero impactar positivamente a vida das pessoas negras e a sua ascensão profissional.

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