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Foi necessário um ano à frente da diretoria de assuntos corporativos da Petrobras para Clarice Coppetti ampliar a presença feminina em cargos de liderança na maior empresa do país. Quando chegou à estatal, em abril de 2023, apenas 19% das altas gestões eram ocupadas por mulheres – no quadro geral de funcionários, a participação era ainda menor: 17%. Muitas iniciativas foram tomadas desde então, até que, em março de 2024, 23,3% dos assentos de chefia estivessem preenchidos por elas.
Coppetti é franca ao tratar das dificuldades da empresa em alcançar os marcos de algumas concorrentes, porque, diz ela, é preciso “olhar para a realidade dentro de casa”. A indústria brasileira de petróleo é, reconhecidamente, de domínio masculino, e a Petrobras repete o padrão.
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Concorrentes europeias começaram a percorrer o caminho da equidade mais cedo e já apresentam melhores resultados. A mais bem posicionada é a britância bp (British Petroleum), com mais da metade das lideranças sob o comando feminino. Na norueguesa Equinor, o indicador é de 35%, também acima dos 30% definidos como meta pela ONU (Organização das Nações Unidas) para 2030.
O ranking da presença feminina em cargos de liderança nas grandes companhias do setor foi elaborado pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), a partir de relatórios de sustentabilidade relativos às atividades de 2022. “Podemos até percorrer novos caminhos a partir de 2024, mas a linha de chegada deve ser a mesma, sem deixar nenhuma ação, nenhum grupo, nenhuma pessoa para trás”, enfatiza Coppetti.
“Cadê as mulheres?”
Bisneta de imigrantes italianos e neta de agricultores gaúchos que trabalharam no campo por toda vida, a executiva da Petrobras é fruto de gerações de matriarcas. “Apesar de toda adversidade, o medo não entra em minha família. Entra é força”, afirma. Para definir as mulheres na Petrobras, ela escolhe a palavra “potência”, por causa das conquistas recentes.
A executiva conta que, nos primeiros dias após aceitar o cargo, enquanto tomava conhecimento da empresa, só foi apresentada a homens. “Lá pelas tantas, perguntei: ‘Cadê as mulheres?’”.
Uma de suas primeiras iniciativas foi desenvolver um programa de valorização da Petrobras como um bom lugar para as mulheres trabalharem. Ao contrário do que acontece na iniciativa privada, em estatais as contratações só ocorrem por meio de concurso público. Para aumentar a presença feminina na empresa, é preciso, portanto, que as mulheres queiram participar das seleções.
Após uma corrida por institutos federais, universidades e escolas técnicas para divulgar a marca Petrobras, no último processo seletivo, neste ano, a participação das mulheres saltou para 37%, um recorde. “É incrível o depoimento das mulheres que chegam aqui. Além disso, as lideranças femininas estão preocupadas em puxar quem está embaixo. Isso é potência”, define a executiva, com entusiasmo.
Enquanto descreve os desafios do último ano, a economista passa as mãos sobre o rosto para mostrar que, ainda no meio da tarde, já não tem maquiagem e nem tempo ou disposição para retoques. Conta também ter dado entrevista a um canal de televisão, recentemente, com o cabelo preso por uma caneta. Seu trabalho é “extenuante”, define.
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Clarice Coppetti não se apresenta como uma executiva tradicional, apesar de já ter sido vice-presidente da Caixa Econômica Federal e membro do conselho deliberativo da Norte Energia, entre outros cargos de liderança. Graduada em ciências econômicas e ciências contábeis e pós-graduada em tecnologia da informação, essa é a sua primeira experiência no setor de petróleo. “É outro mundo. Muitas vezes, a gente vai a eventos e não tem nenhuma mulher na mesa. São os vieses inconscientes.”
Já em sua estreia, ela foi surpreendida pela denúncia de assédio feita por três funcionárias contra um empregado, demitido por justa causa. Outras vieram em sequência, e a resposta foi a criação do programa Petrobras Contra a Violência Sexual, envolvendo diferentes áreas da empresa.
A estratégia foi buscar a implantação de uma série de iniciativas para gerar um ambiente de trabalho diverso e seguro. Grupos organizados de mulheres, representações sindicais, vítimas de violência e líderes foram ouvidos. As investigações de denúncias também foram reforçadas, o que repercutiu em mais casos de afastamentos e demissões. “Estou longe de me sentir satisfeita. São questões muito complexas. Ainda há muito a ser trabalhado.”
Reportagem publicada na edição 117 da revista, disponível nos aplicativos na App Store e na Play Store e também no site da Forbes Brasil.