Atrasos e transtornos no sistema viário 

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O ano está perto do fim, mas as obras do Ribeirão Mobilidade, pacote milionário de investimentos no sistema viário da cidade, ainda seguem em andamento. Mesmo com inaugurações em 2023, por conta de atrasos e impasses com construtoras, o programa não vai ser concluído em definitivo até dezembro, como chegou a garantir o prefeito Duarte Nogueira no ano passado. 

Entre as obras entregues desde janeiro está o túnel José Bonifácio de Andrada e Silva “Patriarca da Independência”, que liga as avenidas Independência e Presidente Vargas, sob a Nove de Julho, e o viaduto Comendador Antônio Lopes Balau, na avenida Brasil sobre a Mogiana, inaugurado na última quarta-feira (20/12). 

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Inaugurado em setembro, no Dia da Independência, após mais de três anos de obras e transtornos para moradores e comerciantes, o primeiro túnel de Ribeirão Preto tem 381 metros, em mão única. Desde a abertura ao trânsito, já foi fechado quatro vezes para intervenções. 

Sandra Brandani: “o cliente foge desse estresse” (Alfredo Risk)

Seguem pendentes os corredores de ônibus do Quadrilátero Central e da Nove de Julho, este último também incluindo as obras de restauração da centenária via e a construção de cerca de três quilômetros de galerias de águas pluviais nas ruas São José e Marcondes Salgado. 

Essas intervenções, assim como aconteceu nas anteriores, já entregues, vêm causando transtornos às pessoas. E, principalmente, aos comerciantes. “As obras em si representam um problema para o trânsito de veículos e para a circulação de clientes no comércio. Quem paga por isso é a população e, sobretudo, o empresariado, pois muitos não conseguem sustentar o prejuízo de fechar as portas ou causado pela redução de clientes nas lojas físicas, uma vez que as obras dificultam o acesso”, afirma a presidente da Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto (ACIRP), Sandra Brandani. 

Devido aos bloqueios e desvios, que intensificam o trânsito e, não raro, causam congestionamentos no Centro, a região de tradicional comércio, muito procurada para as compras de final de ano, é a mais afetada. “O cliente foge desse estresse”, reconhece Sandra. “Somos favoráveis às obras, às novas propostas de estacionamento rotativo, mas reforçamos que o empresariado não pode arcar com o descumprimento de cronograma, pois isso atrapalha a geração e a manutenção de empregos, bem como o desenvolvimento da cidade”. 

Garcia Lopes espera medidas urgentes e efetivas para amenizar situação da Nove de Julho (Alfredo Risk)

Paulo César Garcia Lopes, presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Ribeirão Preto (Sincovarp) e da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), destaca que entre os maiores problemas enfrentados pelo setor está a falta de comunicação das intervenções e interdições, com avisos feito em cima da hora. “Muitas vezes feitos no dia anterior, não dando tempo para que os empreendedores pudessem se planejar para enfrentar a dificuldade”, diz o empresário, citando como exemplo a interdição da Barão do Amazonas, cujo anúncio aconteceu 12 horas antes, “na véspera da Black Friday”, importante data para o comércio daquela região. “Agimos rápido e conseguimos que a Prefeitura revisse o erro adiando a interdição”. 

Na Nove de Julho, avenida que por anos foi o centro financeiro de Ribeirão Preto, a situação não é diferente. As obras tiveram início em junho, mas a construtora Metropolitana, vencedora de licitação de R$ 31 milhões, concluiu 7,7 do total, percentual muito abaixo dos 40% previstos, e teve o contrato rescindido pela Prefeitura de Ribeirão Preto no início deste mês.  

Nesta semana, Duarte Nogueira confirmou que a segunda colocada na licitação, a Rual, declinou o convite para assumir a continuação das intervenções e terá que ser iniciado um novo processo, que deve levar 180 dias a partir da publicação do edital. Neste período, as obras seguem paralisadas. 

“A via estava muito deteriorada, mas agora, durante as obras, tornou-se um deserto. Para melhorar isso, já solicitamos à Prefeitura que cuide dos canteiros para não impedir o tráfego de pedestres e que abra bolsões de estacionamento na região para facilitar o acesso enquanto aguardamos com urgência a contratação de uma nova concessionária para a obra”, revela Sandra. 

“Os impactos de todo esse imbróglio têm sido devastadores para o comércio da Nove de Julho e arredores. Desde a interrupção das obras no túnel da Independência o movimento já vinha caído e, com o início das obras na própria avenida, a situação piorou muito. Alguns estabelecimentos tiveram até 80% de queda de faturamento, muitos demitiram e com a paralização atual os empreendedores estão sem o mínimo de previsibilidade para se planejarem”, conta Garcia Lopes. 

Segundo ele, muitos empreendedores encerraram atividades, outros deixaram a avenida (tendo custos que não previam) e, quem permanece, já amargou grande prejuízo. 

 

“Esperamos medidas urgentes e efetivas que amenizem a grave situação da Nove de Julho”, afirma o presidente do Sincovarp e CDL, citando reivindicações da cidade para a avenida, como a transformação dos espaços de acesso local em bolsões de estacionamento rotativo, plano de trânsito para organizar o fluxo de veículos, instalação de iluminação especial do trecho interditado e isenção de IPTU para os imóveis impactados, entre outros. 

E para piorar, sem movimento de veículos e acesso dificultado pelas obras, a avenida virou um celeiro para ladrões e vândalos de toda espécie. 

Entidades acompanham obras e cobram o Poder Público 

As três principais entidades representativas do comércio de Ribeirão Preto estão acompanhando de perto das obras que afetam a área central da cidade. 

A ACIRP também tem acompanhado de perto as mudanças, por conta do impacto das mesmas sobre as empresas associadas, assim como cobrado do Poder Público a agilidade e a responsabilidade que esse tipo de ação impõe.  

“Ribeirão Preto é uma cidade que cresceu muito nas últimas décadas, mas o urbanismo não acompanhou esse crescimento em termos de infraestrutura viária. As intervenções do programa Ribeirão Mobilidade são uma atualização que a cidade necessita, pois estamos há cerca de 20 anos sem obras de atualização e revitalização urbana”, reconhece Sandra Brandani. 

O Sincovarp e a CDL criaram um Comitê de Acompanhamento, que desde o aumento da complexidade foi ampliado e atualmente conta com a participação de 23 instituições de classe/empresariais, movimentos empresariais e cerca de 60 empreendedores, impactados pelas intervenções. 

“Os integrantes estão em todos os canteiros de obras. São nossos olhos e ouvidos. Acompanham diariamente, fazem fotos e vídeos, buscar informações e tudo isso é compartilhado com o grupo gestor, liderado pelo Sincovarp e a CDL”, explica Paulo César Garcia Lopes.  

O Comitê, segundo as entidades, mapeia as demandas e pontos de atenção, aponta problemas, critica quando é necessário, solicita o que é preciso e, também, ajuda a desenvolver soluções sugerindo planos de ações com medidas práticas e viáveis de serem executadas. 

 Especialista critica programa mobilidade 

Adhemar acompanha desde o início as discussões e afirma que programa local de mobilidade apresenta diversas falhas (Arquivo Pessoal)

O advogado Adhemar Gomes Padrão Neto, que tem especialização em Direito Público e Gerência de Cidades, segue de perto o tema desde que o Governo Federal decidiu investir em obras através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em janeiro de 2007. Ele também acompanhou as discussões, o desenvolvimento e o texto final da Lei 12.587/12 (Plano de Mobilidade), cuja finalidade é ser a ferramenta jurídica orientadora da questão voltada à mobilidade. 

“Não tivemos, em Ribeirão Preto, a necessária discussão pública para que a sociedade conhecesse e escolhesse qual melhor modelo a ser implantado. O que foi e está sendo feito foi pensado em ‘caber’ dentro de um único período/administração e não uma construção ao longo do tempo e por diversas administrações, que é uma característica cruel da política brasileira”, afirma Padrão Neto, destacando que os “reflexos são negativos porque é um investimento pontual e que exigirá novos investimentos quando a necessidade impuser novos meios de transporte, como o VLS (veiculo leve sobre trilhos), por exemplo”. 

Ele diz que a falta de um plano de mobilidade, com a escolha de novos modais de transporte e interação entre eles, assim como possibilidades de expansão no futuro, vai afetar exclusivamente os “hoje chamados corredores”.  

“Nesses locais, por conta da falsa visão voltada a fluidez dos veículos, medidas acessórias não foram amplamente inseridas nos projetos e exemplo disso é a retirada de vagas de estacionamento rotativo”, opina Padrão Neto.  

O caso mais grave, segundo o advogado, é avenida Dom Pedro I, “que não poderia se tornar ‘corredor’ da forma que foi feita”.  

“Para absorver a falta de vagas seria preciso, no mínimo, criar um ou dois bolsões de estacionamento. Isso implicaria em desapropriação de áreas, mesmo que fosse para construir um edifício-garagem”, afirma Padrão Neto, prevendo que a queda da atividade comercial será acentuada, podendo chegar ate mesmo num abandono e transformação em locais sem qualquer atrativo comercial, “situação que hoje acontece na Nove de Julho”. 

O empresário Paulo César Garcia Lopes, presidente do Sincovarp e da CDL, compartilha a mesma opinião. “Entendemos que a Prefeitura queira realizar todas as obras de mobilidade que estavam previstas, inaugurá-las ainda nesta gestão. Não somos contrários às obras! Mas a qual custo e sacrifício, impostos à sociedade, em especial ao comércio? Uma intervenção desse tamanho não poderia acontecer sem planos A, B e C. As obras de mobilidade geraram impactos negativos no comércio da cidade inteira, e que mal tinha se recuperado dos efeitos de uma pandemia devastadora”. 

 



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